COMO VOCÊ
INTERPRETA?! LIV
O capítulo 49 – “Regressando a Casa” –, é o penúltimo dos 50
capítulos de “Nosso Lar”. Nele, de maneira sintética, o autor narra as suas
surpresas de espírito, quando, depois de quase dez anos no Mundo Espiritual,
tem oportunidade de rever a família na Terra.
Durante uma semana, André, despedindo-se de Dona Laura,
permaneceria em visita à família consanguínea, domiciliada no Rio de Janeiro.
Logo nos primeiros parágrafos, o autor espiritual fala de sua
emoção ao rever Zélia, a esposa, que, então, se mostrou insensível ao seu
espontâneo gesto de amor. Ela estava conversando com um cavaleiro, médico, que
havia ido ver a Ernesto, o seu segundo esposo, que estava acamado, acometido de
grave enfermidade nos pulmões.
A constatação de André é uma lição a quantos consideram que
os seus afetos, por mais queridos, sejam sua propriedade. Afinal, Zélia não
parecia ser a “alma gêmea” de André Luiz, porque as “almas gêmeas”, com raras
exceções, costumam ser fieis àqueles que demandam o Mais Além...
*
Zélia chorava, dizendo ao médico que cuidava de Ernesto que
não haveria de suportar uma segunda viuvez. E André registra nas páginas do
livro:
“Um corisco não me
fulminaria com tamanha violência. Outro homem se apossara do meu lar. A esposa me
esquecera. A casa não mais me pertencia. Valia a pena ter esperado tanto para
colher semelhantes desilusões? Corri ao meu quarto, verificando que outro
mobiliário existia na alcova espaçosa. No leito, estava um homem de idade
madura, evidenciando melindroso estado de saúde. Ao lado dele, três figuras
negras iam e vinham, mostrando-se interessadas em lhe agravar os padecimentos.”
Além de tudo, Zélia se consorciara com um homem de espírito
comprometido com entidades infelizes que se valiam de seu estado de debilidade
para vampirizá-lo, concorrendo para o seu desenlace.
*
André, desde que desencarnou, mantivera-se na expectativa de
um dia, poder reencontrar a companheira, que supunha ser a metade de sua alma...
Quantas surpresas reservam-se ao espírito na desencarnação?!
Convém, pois, que todos nós estejamos sempre preparados para enfrentar os
próprios equívocos... André, na juventude, pressionado pela família, renegara o
amor de uma jovem serviçal de sua casa, e agora, talvez, consorciando-se por
conveniência social, sentia-se abandonado!...
A Lei de Causa e Efeito é inexorável, e, no espaço e no
tempo, não poupa a espírito algum.
*
Os filhos de André, igualmente, quase que já o haviam
esquecido, a não ser pela filha primogênita, que, naquele dia, começara a
pensar no pai desencarnado. Zélia, no entanto, repreende a filha – simplesmente
por mencionar a memória de André, ela repreende a filha! Positivamente, Zélia
não era a “alma gêmea”, ou, pelo menos, a alma de afinidade com os seus mais
elevados sentimentos.
*
Zélia, ao repreender a filha mais velha, diz o que André,
amargamente, pode escutar:
“(...) Já proibi a
vocês, terminantemente, qualquer alusão nesta casa, a seu pai. (...) Já vendi
tudo quanto nos recordava aqui o passado morto; modifiquei o aspecto das
próprias paredes, e você não me pode ajudar nisso?”
André, em sua própria casa, era considerado um “passado morto”!...
Para inteirar, a filha caçula de André lança acusações sobre
a irmã por se interessar pelo “maldito”
Espiritismo, negando que os mortos pudessem voltar a Terra.
- Onde já se viu tal
disparate? Essa história dos mortos voltarem é o cúmulo dos absurdos!
*
Convém, pois, a vocês que ainda vão morrer prepararem-se, não tanto para as surpresas de além-túmulo,
mas para um melhor conhecimento próprio, junto àqueles que, infelizmente,
revelam-se de espírito tão pequeno.
Zélia, sem dúvida, tinha todo o direito de consorciar-se com
Ernesto – afinal, já amargara muito tempo de solidão afetiva, na condução
solitária dos destinos da família, para o que ela se revelara frágil. Todavia,
ela não necessitava, praticamente, de exorcizar a memória do ex-marido, pai de
seus três filhos, que, pelo menos, lhe deixara o teto sob o qual passara a
viver com outro companheiro.
INÁCIO FERREIRA
Uberaba – MG, 23 de abril de 2018.