domingo, 18 de abril de 2021

 

A Obra Literária de Chico Xavier

(Em Homenagem ao 18 de Abril)

 

Alguns amigos nos solicitam, ainda que rapidamente, uma análise literária da Obra Mediúnica de Chico Xavier. Por não sermos experts no assunto, não poderemos fazê-lo, de vez que, segundo cremos, ele cabe aos especialistas.

Contudo, podemos dizer que a Obra Mediúnica de Chico Xavier, desde a sua primeira publicação, “Parnaso de Além Túmulo”, vem sendo analisada literariamente, causando surpresa aos estudiosos isentos pela sua autenticidade.

Chico Xavier psicografou em todos os gêneros literários: épico, lírico e dramático – por seu intermédio, desde 1927, os Autores Espirituais escreveram romances, novelas, contos, crônicas, poemas, canções...

Chico, ainda, produziu notável literatura infanto-juvenil, através, por exemplo, das obras intituladas: “Os Filhos do Grande Rei”, “Mensagem do Pequeno Morto”, “História da Maricota”, “Jardim da Infância”, “Cartilha do Bem”, “Pai Nosso”, etc.

Habitualmente, os grandes escritores, os mais premiados, revelam inata tendência para gênero específico de literatura, mais consoante com a sua capacidade intelectual e preferência. Na condição de médium, porém, Chico serviu de instrumento para diversos espíritos que, por ele, se manifestavam com a sua especialização literária: os poetas do “Parnaso”, os cronistas de “Vozes do Grande Além”, com destaque para Humberto de Campos, em “Crônicas de Além-Túmulo”, então considerado o maior cronista brasileiro, e ocupante da cadeira 20 da Academia Brasileira de Letras...

Emmanuel, que, em um de suas múltiplas encarnações, foi o Padre Manoel da Nóbrega, considerado o Primeiro Escritor do Brasil, dedicou-se, através do versátil médium, a escrever épicos históricos, em Português castiço, impecável – as suas Obras Literárias, essencialmente Doutrinárias, aliás, como todas as demais, versam sobre o Cristianismo Nascente. Em “Paulo e Estêvão”, por exemplo, tendo como inspiração a vida de Paulo de Tarso, o denominado Apóstolo dos Gentios, nos deparamos com a História do Cristianismo em seus primeiros tempos. Emmanuel, no livro “Renúncia”, ainda nos traz vestígios do trabalho que, ao longo dos séculos, os espíritos, e, dentre eles, Alcíone e Padre Damiano, efetuaram em favor do Cristianismo, na Europa e na América, nos preparativos espirituais para que a Terceira Revelação se concretizasse, a partir da publicação de “O Livro dos Espíritos”, em Paris, na França, a 18 de Abril de 1857.

O trabalho de André Luiz, pseudônimo do Dr. Carlos Chagas, do ponto de vista literário e doutrinário, pode ser considerado inovador, porque se servindo de resumidas narrativas, o festejado Autor Espiritual de “Nosso Lar”, dá sequência à revelação em torno da vida dos espíritos além da morte – as obras de André Luiz, dentro da Literatura, podem, sem dúvida, ser classificadas como dramáticas, porque versam sobre as realidades do espírito na Vida Maior – de “Nosso Lar” a “E a Vida Continua...”. Desse mesmo autor que, quando encarnado, foi um cientista de mérito, podemos colocar em destaque o excelente “Evolução em Dois Mundos”, publicação de natureza científica que impressiona pela sua originalidade, a que nenhuma outra obra de autor encarnado ou desencarnado pode se comparar.

Interessante frisar que toda a Obra Literária de Chico Xavier, hoje com mais de 500 livros publicados, além de ter sido gramaticalmente vasada de maneira exímia, desdobra o chamado “Pentateuco Kardeciano”, ou amplia a Codificação, aprofundando-se no estudo de seus Princípios Básicos: Reencarnação, Mundo Espiritual, Lei de Causa e Efeito, Intervenção dos Espíritos no Mundo Corpóreo, Pluralidade dos Mundos Habitados, etc. Portanto, do ponto de vista doutrinário, e não apenas literário, a Obra Mediúnica de Chico Xavier, pode ser considerada irretocável, sem a menor contradição com a ciclópica Obra de Allan Kardec, concebida em meados do século XIX.

Não obstante, os espíritos que pelo médium se expressaram durante 75 anos consecutivos – Chico psicografou a sua primeira página do Mundo Espiritual em 8 de Julho de 1927 –, continuariam dando mostras de sua identidade e estilo, quando, a partir da década de 70, os comunicados, ao se transformarem em depoimentos pessoais, trouxeram à escrita mediúnica os habitantes comuns da Pátria Espiritual, que, através do médium, intensificaram os seus contatos, em verdadeiras legiões, e com cada um deles escrevendo à sua maneira, inclusive, por vezes, valendo-se de gírias – grande parte desses espíritos, ao término de suas cartas, lograva assiná-las com a própria letra, além de mencionar detalhes de sua experiência reencarnatória tão somente conhecidos da família. Podemos, pois, dizer que, com Chico, esse novo gênero literário, as “Cartas Familiares”, inauguraram uma nova fase no intercâmbio entre encarnados e desencarnados.

Dentro de todos as espécies literárias que Chico psicografou, a diversidade de estilos é tão grande que, sem dúvida, o assunto carece de ser estudado por especialistas, de vez que, por si só, comprova a imortalidade da alma e a possibilidade dos vivos do Além entrar em contato com os vivos da Terra.

Através de Chico Xavier, portanto, a Literatura de Além Túmulo passou a integrar o vasto campo da Literatura, que não mais se restringe a autores encarnados.

Em 1932, quando “Parnaso de Além Túmulo” foi publicado pela Federação Espírita Brasileira, com o seu médium contando apenas 22 de idade, vários críticos se manifestaram a respeito da obra que passou a ocupar as páginas dos principais periódicos da época. E, para encerrar este pequeno arrazoado, escrito com o intuito de relembrar o 18 de Abril – Dia do Livro Espírita –, transcrevemos abaixo o que o célebre Humberto de Campos, que também escrevia sob o pseudônimo de “Conselheiro XX”, teve coragem de dizer sobre o “Parnaso”:

“Eu faltaria ao dever que me é imposto pela consciência, se não confessasse que, fazendo versos pela pena do Sr. Francisco Cândido Xavier, os poetas de que ele é intérprete apresentam as mesmas características de inspiração e expressão que os identificavam neste planeta. Os temas abordados são os que os preocupavam nesta vida. O gosto é o mesmo e o verso obedece, ordinariamente, à mesma pauta musical. Frouxo e ingênuo em Casimiro, largo e sonoro em Castro Alves, sarcástico e variado em Junqueiro, fúnebre e grave em Antero, filosófico e profundo em Augusto dos Anjos – sente-se, ao ler cada um dos autores que veio do outro mundo para cantar neste instante, a inclinação do Sr. Francisco Cândido Xavier para escrever à la manière de... ou para traduzir o que aqueles altos espíritos sopraram ao seu.”

 

INÁCIO FERREIRA

 

Uberaba – MG, 18 de Abril de 2021

 

domingo, 11 de abril de 2021

 

Paulo, o Pedinte – III

 

- Doutor, o senhor não fica com raiva de mim, não?! – perguntou-me o pobre irmão, depois que enxugou as lágrimas com o lenço surrado que lhe estendi.

- Raiva?! De você?! Claro que não...

- Eu não quero decepcioná-lo...

- Você não me decepciona, Paulo – respondi. – Decepção, eu sempre tenho é comigo mesmo...

- Sabe o que é, Doutor...

- Sei...

- Não tenho como agradecer ao senhor...

- A mim, você não tem como, e nem o que agradecer mesmo – repliquei. – A nossa gratidão deve ser sempre para com Jesus Cristo...

- Eu sei, eu sei... É modo de falar, Doutor, modo de falar... Eu não tenho nada contra ninguém...

- Entendo...

- Sabe o que é, Doutor... – repetiu-se.

- Diga lá, meu caro... Não hesite tanto...

- Eu queria pedir um tempo...

- Paulo, eu não sou dono do tempo...

- Um tempinho só... Eu ainda não me sinto preparado...

- Compreendo...

- O senhor me propõe “pegar” ou “largar”... Não é que eu queira largar...

- Você apenas não quer pegar...

- Mais ou menos...

- A vassoura, o lápis...

- Eu até que poderia ir com o senhor, mas... eu não vou ficar...

- Você é livre...

- Gostaria de pensar mais...

- Bem, as portas foram abertas – oferecemos a você o que está ao nosso alcance...

- Eu gosto da liberdade, da noite, de ver as estrelas no céu...

- De dormir ao relento, de levantar-se...

- Sim, a hora que quiser, sem nenhuma obrigação, nem mesmo, Doutor, a de lavar o rosto...

- Muito menos a de tomar banho, todos os dias – gracejei.

- Estou vivo, não estou?!...

- Vivíssimo!...

- Não morri, não é?!...

- E nem morrerá!...

- Então, Doutor, para que pressa?! Eu gosto de andar por aí... Eu não sou do mal, Doutor?! Eu sou do bem!...

- Se você fosse do mal...

- Jesus buscou a Paulo de Tarso, não é?!...

- Buscou – respondi. – Espero que você não esteja esperando que Ele venha buscar a você...

- Não, Doutor, não é isso... É que eu ainda não achei a minha Estrada de Damasco – filosofou.

Houve uma pausa e Paulo tornou a perguntar:

- O senhor não fica com raiva de mim, e nem triste comigo?!...

- Bem, um pouquinho triste, eu fico, sim...

- Fica não, Doutor... Se eu precisar, vou atrás do senhor...

- Posso não estar...

- Por quê?!...

- Tudo muda... Quem sabe, quando você me procurar, eu já tenha voltado?!...

- Voltado?!...

- Sim, para a Terra...

- O senhor terá coragem?!...

Sorri da espontaneidade do amigo e indaguei:

- Sinceramente?!...

- Sim, sinceramente... O senhor teria coragem?!...

- Coragem, eu não teria, mas, se o Senhor mandar, eu tenho que obedecer...

- Então...

- Então, Paulo, eu preciso ir andando – falei. – Você vai ficar bem?!...

- Vou, Doutor, não se preocupe...

- É uma pena! – exclamei, lamentando.

- Não era uma vassoura e... um lápis?! – ironizou, erguendo-se do chão e pegando uma bolsa com alguns poucos pertences.

- Estou me referindo a outro tipo de pena – frisei.

- Posso dar um abraço no senhor?!...

- Claro – respondi –, até dois, no máximo...

Abraçamo-nos e ele, com as suas pernas finas e a barba por fazer, antes de ganhar a rua, perguntou-me:

- O senhor teria uns trocados?!...

 

INÁCIO FERREIRA

 

Uberaba – MG, 11 de Abril de 2021.

 

 

 

domingo, 4 de abril de 2021

 

Paulo, o Pedinte – II

 

- Pega, ou larga?! – insisti ante a hesitação de Paulo.

- Decidir assim, tão depressa?! – retrucou. – A gente tem que ter um tempo para pensar... Eu pensei que...

- Pensou o quê, meu caro?!

- Que morrer seria diferente... Pensei que a gente fosse descansar...

- Você descansou a existência inteira... Em que trabalhou?! Conte-me...

- Bem, eu... Nunca fui assim de ficar num serviço só... Ficava uns tempos num, uns tempos noutro...

- Paulo...

- Depois de desencarnar, a gente tem que trabalhar mesmo, Doutor, para valer?! O senhor deve estar brincando...

- Olhe para a minha cara...

- O senhor, não nego, é uma pessoa muito simpática – não se trata de beleza, beleza, mas...

- Pega, ou larga?!...

- A vassoura?!...

- A vassoura, e o lápis!...

- O lápis também?! Não, Doutor, o lápis?!...

- Trabalhar e estudar...

- Para que saber assinar mais que o próprio nome?! Doutor, quanto mais a gente conhece, mais a gente sofre...

- Prefere a rua, não é?!...

- Tenho muitos amigos... Quando eu me canso, onde estiver, paro, deito e durmo – debaixo de uma marquise, da sombra de uma árvore...

Fez uma pausa e falou:

- Tenho o que comer... As pessoas são boas, generosas... Sempre ganho um lanche, uns trocados... Eu não sei... O mundo dos homens é muito complicado – na rua, eu vivo em paz...

- Complicado?!...

- Os que moram na Casa de Deus bagunçam demais... Ambição, orgulho, uma briga sem fim...

- Você não está fora da Casa de Deus – ninguém está! Você é um de seus inquilinos, e não quer pagar o aluguel...

- Aluguel?!...

- Paulo, o que você tem dado em troca pelo ar que respira, pela luz do Sol e, até mesmo, pela beleza das flores?! Conte-me...

- Uai, eu usufruo...

- Não se sente devedor?! Não percebe que o Cristo, o Pedinte dos Pedintes, está de mãos estendidas para você?! O que você já lhe deu?! Quantas moedas de sua boa vontade para colaborar com Ele na construção do Mundo Melhor?!...

- Eu não tenho nada...

- Que vergonha, Paulo! Você tem coragem de dizer que não tem nada... O egoísmo não ataca apenas quem tem dinheiro, não! O egoísmo é a pior das doenças que conheço...

- Não dou prejuízo a ninguém, nunca fiz mal a ninguém...

- E bem?! Você faz o bem?! Responda-me em sã consciência...

- Não faço o mal...

- Não é suficiente... Os omissos se omitem em favor do mal, e não em favor do bem...

- O senhor aperta muito a gente...

- Pega, ou larga?!...

- A vassoura, e o lápis?! – tornou a perguntar. – Os dois de uma vez...

- De uma vez só... Claro, você tem a opção de continuar vagando e... sofrendo!...

- Eu não sofro, Doutor?!...

- Não?!...

Paulo, pela primeira vez, chorou, e, começando a chorar, chorou como raramente tenho visto um homem chorar – com muitos anos de treino, sentou-se com facilidade no chão e, levando as mãos às faces, chorou feito uma criança crescida, que é o que o homem é...

Deixando que ele vertesse o rio das lágrimas que trazia represado no coração, puxei uma cadeira, sentei e... esperei.

 

INÁCIO FERREIRA

 

Uberaba – MG, 4 de Abril de 2021.

 

domingo, 28 de março de 2021

 

Paulo, o Pedinte - I

 

Um dos “pioneiros” do Covid, em Uberaba, foi Paulo, o pedinte meu amigo.

Não o conheci quando eu ainda estava na carcaça, mas, quase toda terça-feira, à noite, ao término das reuniões de estudos na Casa Espírita “Bittencourt Sampaio”, tínhamos oportunidade de nos encontrar à porta da Instituição.

Não raro, igualmente, nos víamos, quando, então, ao dormir em qualquer pedaço de chão, ele conseguia colocar a ponta do nariz deste Outro Lado, antes de voltar correndo para o corpo...

Paulo, em vidas anteriores, fora um boêmio inveterado, e possuía, sim, alma de artista – gostava de escultura, de modelagem, etc. Em consequência de seus desregramentos, tinha a barriga toda costurada – quase desencarnara antes, em três ou quatro cirurgias que lhe extirparam pedaços do estômago e de outros órgãos...

Ele vivia nas ruas e costumava fazer “ponto” na praça da Igreja da Abadia, sendo conhecido de muitos – educado, conversa boa, apenas tendo ciúme quando um outro pedinte invadia a sua “área”, e a ele se adiantava nos adjutórios...

Ano passado, vitimado pelo Covid, foi levado para o Hospital das Clínicas, quase sem respirar – eu não sou da época do Covid, ou do “Sars 2”, mas sou do tempo do enfisema, e sei o que é desencarnar sufocado...

Quando Paulo, na condição de indigente, fechou os olhos para as ilusões do mundo, fui vê-lo, sendo que, ao avistar-me, foi logo puxando prosa:

- Parece que eu conheço o senhor...

- Não sei... Tenho uma cara comum...

- Não, eu conheço o senhor... Esse seu jaleco branco é famoso... O senhor, por acaso, é o Dr. Inácio Ferreira, o médico lá do Sanatório Espírita?!...

- Dizem que sou...

- Ah, eu já o vi de longe, lá na porta do Sanatório... Fiz um busto do senhor, em argila, para um amigo...

- Eu vi esse tal busto...

- O senhor gostou?!...

- Não, não gostei – respondi.

Ele sorriu meio sem graça e perguntou:

- Uai, por quê?!...

- Por causa do nariz – você me botou com o nariz do Manoel Roberto... Eu nunca tive um nariz daquele tamanho, mais parecido com a tromba de um elefante...

Paulo sorriu e... tossiu.

- Tenha calma – disse-lhe –, não faça grandes esforços...

- A culpa é do senhor, que me fez sorrir...

- Sempre me culpam de alguma coisa – aliás, em matéria de culpa, creio que só tenho perdido para um político brasileiro...

- Ah, já sei...

- Pois é, Paulo – falei, mudando de assunto. – Você tanto fez que... deixou a carcaça!...

- Desencarnei?!...

- Sim...

- Tão fácil assim?!...

Houve pequeno silêncio que não quebrei.

- E agora?! – indagou-me.

- ?!...

- Eu não sei fazer nada... Estou sem gás de cozinha na minha casa, precisava de uns trocados...

- Ficou sem gás em sua casa e... em seus pulmões...

- Pneumonia, Doutor?!...

- Também...

- E agora?! – repetiu a pergunta. – Eu não tenho ninguém...

- Você tem uma multidão...

- O que vou fazer?!...

- Se quiser, posso empregá-lo, a troco de casa, comida e roupa lavada e passada...

- E não sei fazer nada...

- Sabe varrer o chão?!...

- Varrer o chão é simples, mas eu nem vassoura tenho...

- Com vassoura, meu irmão, você não se preocupe, pois temos um enorme estoque – a bem da verdade, temos uma fábrica de vassouras...

Paulo ficou pensativo – não estava mesmo, desde muito, acostumado a trabalhar.

- Paulo, esqueça o mendigo, que já era, ou já foi, sei lá... Comece a varrer por fora o que você precisa varrer por dentro – todos carecemos de varrer por dentro!...

Silêncio.

- É pegar, ou largar!...

 

INÁCIO FERREIRA

 

Uberaba – MG, 28 de Março de 2021.

domingo, 21 de março de 2021

 

VISITANDO UMA IRMÃ

QUE DESENCARNOU PELO “CORONA”

 

Por solicitação de um amigo de um amigo, amigo de um amigo meu, fui visitar, em São Paulo, uma irmã que, com a filha, desencarnou vitimada pela ação do “Corona”.

Entre nós desdobrou-se, então, na UTI, o seguinte diálogo:

- Licinha, minha irmã, como você está passando?! Vejo que melhor, não é?!...

- Graças a Deus! – respondeu com voz pausada. – Imaginei que fosse desencarnar... Os médicos aqui do hospital são muito competentes e educados... Sinto que, a cada dia, estou melhorando...

- E os enfermeiros também – acrescentei. – São muito solícitos... Ainda há pouco tive oportunidade de vê-los em ação – são uns heróis e umas heroínas...

- Sim, eu não posso me esquecer deles – trabalham tanto! A toda hora estão aqui, medindo a minha temperatura, a pressão... O hospital é muito grande...

- Logo você terá alta – disse-lhe. – Andei dando uma olhada em seu prontuário... Você já está ótima...

- Tive uma falta de ar muito grande... Realmente, pensei que fosse desencarnar... Cheguei até a ver o Carlos Alberto...

- O Carlos Alberto?!...

- Sim, o meu esposo... Eu vi na beirada da cama – vi a ele e a uma jovem que desconfio ser a minha mãe... Não sei se foi a D. Rosa, que desencarnou com quase cem de idade – ela estava diferente...

- Ah, os espíritos, muitos, rejuvenescem quando deixam o corpo – depois de algum tempo...

- Ela era muito parecida com a minha mãe... Não disse nada, não! – apenas ficou me olhando, sorrindo, e o sorriso dela me transmitia calma... Talvez, num momento de febre, eu estivesse delirando...

- Talvez – respondi. – Febre alta, muitos medicamentos, o oxigênio...

- Não sei... Quando eu a via – a jovem apareceu para mim duas vezes –, a minha respiração normalizava, e eu me acalmava... Nossa, esses dias aqui têm sido muito difíceis – deve fazer parte da prova que tenho que passar...

- Sem dúvida...

- Ainda não sei da Lívia, minha filha – ela também estava com “Corona”... O irmão dela, que é médico, pediu a um amigo dele que me dissesse que ela já estava de alta e que me esperaria em casa...

- Você é de Uberaba, não é, Licinha?!...

- Sim, sou de Uberaba, a terra de Chico Xavier...

- A cidade em que ele viveu por quase cinquenta anos... O Chico nasceu em Pedro Leopoldo, perto de Belo Horizonte...

- Isso mesmo – concordou. – Ele é de Pedro Leopoldo, mas eu me lembro de quando o Chico foi morar em Uberaba... Estive lá muitas vezes... A minha mãe era espírita...

- Que bom que você está bem...

- O senhor não tem medo do contágio do vírus, não?! – indagou-me. – Está sem máscara...

- Não, não tenho – redargui. – Esse vírus não pode mais me pegar – estou imunizado...

- O senhor já tomou vacina?! Dizem que a vacina ainda não saiu, ou já?! Nem sei... Faz muitos dias que estou aqui...

- Não, não tomei vacina – respondi. – Mas, desde algum tempo, eu estou imune – esse vírus não me contamina... Outros, talvez, mas não o “Corona”...

- Eu, se fosse o senhor, tomaria cuidado, porque aqui neste hospital dizem que muita gente já desencarnou...

- Eu sei... Aqui e em muitos outros hospitais do Brasil inteiro, e do mundo...

- Mas, estamos conversando, o senhor me chamou pelo nome, e eu não sei o nome do senhor... Desculpe a minha grosseria. Quem é o senhor?!...

- Um irmão...

- Sim, mas... o seu nome?! Gostaria de dizer ao meu filho e às meninas que o senhor me visitou...

- Inácio... O meu nome é Inácio Ferreira...

- Inácio Ferreira?! – questionou, intrigada. – O médico psiquiatra, do Sanatório Espírita de Uberaba?!...

- Eu mesmo...

- Mas, que estranho... O Dr. Inácio Ferreira já desencarnou faz um tempão...

- Precisamente, minha irmã, no dia 27 de setembro de 1988...

- Espera aí... Estamos em 2020, não?!...

- Até o próximo dia 31 de dezembro, sim...

- Então?!...

- Você está de alta, Licinha, livre do “Corona”!...

 

INÁCIO FERREIRA

 

Uberaba – MG, 21 de Março de 2021.

 

domingo, 14 de março de 2021

 

O Que Sei

 

O que sei é que devo seguir adiante procurando me corrigir a cada dia, fazendo pelos semelhantes o melhor que esteja dentro de minhas possibilidades, e, se possível, neste sentido, indo além de minhas possibilidades...

O que sei é que preciso ser coerente comigo mesmo, não entrando em conflito com a minha consciência, e não consentindo que os interesses subalternos me corrompam o Ideal...

O que sei é que devo trabalhar, todos os dias, em minha renovação íntima, conquistando vitórias anônimas sobre o “homem velho” que ainda prevalece em mim...

O que sei é que careço de errar menos, e muito menos, nas lutas que continuo travando contra as mazelas que teimam em me subjugar o espírito...

O que sei é que necessito criar, urgentemente, novos hábitos, à luz do Evangelho, porque somente assim não continuarei cativo do egoísmo, essa “chaga da Humanidade” que tantos males vem provocando à sociedade, entravando o progresso da civilização...

O que sei é que devo me esforçar ao máximo para cumprir com o meu dever, sem esperar por aplausos ou encômios de qualquer natureza, que, certamente, me induziriam a crer nas ilusões que, durante muito tempo, acreditei...

O que sei é que, custe o que custar, preciso ser fiel aos princípios da fé que abracei, porque, caso contrário, ser espírita não fará o menor sentido para mim, como, até agora, cousa alguma tem feito...

O que sei é que, mesmo não deixando de errar, devido ao meu estrabismo secular, que me impede de ver os reflexos da Verdade com nitidez – o que sei é que, mesmo aí, eu devo ser sincero, porquanto a sinceridade de meus propósitos haverá de falar por mim diante do Tribunal da Divina Justiça...

O que sei é que, nem que seja a passos de tartaruga, careço de procurar sair do lugar comum, dando a minha humilde colaboração para que este mundo ao qual também ainda pertenço – a Terra – venha a ser melhor para os que nele se encontram, e, consequentemente, para aqueles que, um dia, nele se encontrarem, entre os quais, evidentemente, eu me incluo...

O que sei é que não posso parar para ouvir quem me critica ou quem me censura, ou ainda quem me condena, porque não posso continuar perdendo mais tempo com suscetibilidades tolas, ou com melindres que são próprios dos espíritos infantilizados...

O que sei é que tenho muito a fazer e, realmente, não posso perder tempo com quem dispõe de tempo para continuar nas esquinas da vida observando a quem passa, com o único intuito de julgá-lo...

O que sei é que sei que cada um há de responder pelos seus atos, e, sendo assim, nada há de ficar oculto sob as pedras da conveniência ou das ambições que levam os homens a se afastarem da honestidade...

O que sei é que sei o que sou – pelo menos isto, pela graça de Deus, eu já sei –, e por saber o que já sei, convém que persevere no afã que me leva a servir, ignorando tudo o que me impeça de vir a ser mais, procurando a ser menos...

O que sei, enfim, é que fora de Jesus Cristo, o Espiritismo não me interessa, e o que dizem certos espíritas menos ainda!...

 

INÁCIO FERREIRA

 

Uberaba – MG, 14 de Março de 2021.

 

 

domingo, 7 de março de 2021

 

Gatos e Ratos

 

Foi no comecinho da década de 60...

Os gatos que residiam conosco, no Sanatório, haviam sido acometidos por uma epidemia – grave desarranjo intestinal – e, infelizmente, vieram todos, um a um, a desencarnar... Em vão, tentamos todos os recursos a fim de impedir que passassem para o Outro Lado, inclusive utilizando a terapêutica do passe e da água fluidificada.

Os fundos do Sanatório se transformou num pequeno cemitério, com várias cruzes, sobre as covas que eu e o Manoel Roberto fazíamos questão de cavar com um enxadão, na terra úmida.

Fiquei muito aborrecido e cheguei a dizer ao Manoel e à Modesta que não queria mais bichanos no Sanatório, porque a gente se apegava e depois...

O tempo passou, talvez uns quatro, cinco meses, e, de quando em vez, um dava um passeio lá pelo “cemitério”, murmurando algumas palavras com o propósito de prece, com alguns funcionários imaginando que, por conversar sozinho, eu logo seria candidato a uma das celas reforçadas no porão do hospital.

Um dia, estando no escritório, enrolando um cigarro de palha, recebi a visita da cozinheira que pedia permissão para dois dedos de prosa comigo.

- Licença, Doutor! – solicitou a simpática auxiliar, sempre com um pano muito alvo a lhe prender os cabelos.

- O que houve?! – perguntei. – Acabou o feijão?!...

- Não, Doutor – respondeu-me –, são os ratos...

- Que ratos?! O único que conheço por aqui, com trânsito livre por toda parte, é o Manoel... O que ele anda aprontando?!...

- Não, Doutor, não é o sr. Manoel, não – explicou-se, um tanto embaraçada. – São ratos, ratos mesmo – ratos e ratazanas, de todos os tamanhos... Estão dando na dispensa e atacando todo o estoque de alimentos... Tem um que, de tão grande, parece um gambá...

- Tem certeza de que não é o Manoel?! – indaguei, observando o amigo que chegava de uma de suas rondas pelos quartos.

- Eu o quê agora, Doutor?!... – questionou.

- Nada – redargui. – Estou recebendo uma denúncia de que os ratos, um do tamanho de um gambá, estão tomando conta do Sanatório...

- Desde que os bichanos morreram, Doutor – interveio a cozinheira. – Nem os ovos de galinha têm sido poupados... O que se parece com gambá mete medo na gente...

- Vamos providenciar ratoeiras (ops), jaulas, pois, pelo que você está dizendo... Bichanos, sinceramente, eu não quero mais aqui – desde que passamos por aquele gaticídio...

De fato, o Manoel deu um jeito de armar algumas ratoeiras, mas, a não ser um ou outro, nenhum dos maiores se interessava pelos nacos de queijo curado que, afinal, nenhum rato que se preza costuma rejeitar.

Os estragos na dispensa, e até na farmácia, continuaram acontecendo, até que, belo dia, ao chegar ao escritório, me deparei com um rato em cima de minha mesa, mexendo nas palhas de eu enrolar os meus cigarros...

- Agora – falei em voz alta –, o assunto muda de figura...

Chamei o Manoel e disse ao prestimoso colaborador:

- Sai aí pelas ruas, na vizinhança, e oferece serviço ao primeiro gato que encontrar... Compre umas latas de sardinha e leva um saco com você – quando ele estiver comendo, você captura o bichano, que, afinal, não deve pertencer a ninguém nas redondezas... Não me volte aqui sem um saco de gatos!...

Assim foi feito e, em breve, a paz voltou a reinar na dispensa do Sanatório e, também, sobre os maços de palha em minha mesa, no escritório.

Lembrei-me deste fato a propósito do aniversário de Chico Xavier que lá vem se aproximando, e que será comemorado no dia 2 de Abril – já quase 19 anos de sua desencarnação, ocorrida em 30 de junho de 2002!...

Foi só o Chico, esse “bichano” de Jesus Cristo, desencarnar, os ratos e as ratazanas, alguns do tamanho de um gambá, criados com tutu de feijão e vatapá, apareceram no dispensário da Doutrina Espírita e estão fazendo um verdadeiro estrago – roem o que podem e mijam por todo o lado, espalhando uma fedentina sem tamanho e ameaçando todo mundo com uma leptospirose federativa.

 

INÁCIO FERREIRA

 

Uberaba – MG, 7 de Março de 2021.

 

 

 

 

 

 

domingo, 28 de fevereiro de 2021

 

Deixa o Resto

 

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Cumpra com o seu dever e deixa o resto.

Não se envolva, ou não se permita envolver, com o que possa se lhe constituir em perda de tempo, ou em desgaste emocional inútil.

Não tergiverse com a consciência.

Valha-se da oportunidade de trabalho na presente encarnação para semear o quanto lhe seja possível.

Cerra, de vez, ouvidos à crítica, sem a preocupação de rebater a nenhuma.

Acautele-se contra a possibilidade de tropeço no trecho de caminho que lhe cabe percorrer.

Não seria agora que deveríamos esperar por qualquer reconhecimento pelo diminuto esforço que, em conjunto, temos empreendido.

Silencia um tanto mais.

Não acolha qualquer sugestão das trevas relativa a desanimo ou a cansaço.

Infelizmente, são muitos os que estão se perdendo na jornada, cedendo à ambição do poder, ou mesmo a situações que, em breve, lhes instalarão o desencanto na alma.

Você sabe que, para quem toma a decisão de servir com Jesus, é indiferente as pedras ou as flores que lhe atiram.

Continue não negociando os seus princípios, com os quais, todos os dias, peço a Deus que você venha a deixar o corpo ao se transferir para cá...

Persevera, nada tendo a perdoar a quem seja, e tudo fazendo para que mágoa e rancor não lhe embaracem os passos, porque a necessidade de pedir perdão ou de perdoar, realmente, para quem busca os Cimos, é desnecessária pedra de tropeço.

Muito mais da metade do carma que envolve o espírito na Terra, no mais Além, é falta de melhor saber administrar os problemas naturais da existência.

Não alimente qualquer esperança no campo da facilidade.

Feliz daquele que, lutando até o seu último dia na romagem terrestre, não oferece oportunidade para que as trevas se infiltrem em seu pensamento.

Os luminares do espírito aos quais, verdadeiramente, devemos honrar, não conheceram trégua na luta que muitos travaram contra o assédio do mal desde a infância.

Reconhecendo a nossa enorme falta de mérito, por que conosco seria diferente?! O que haveríamos de fazer de nós mesmos sem que, constantemente, como o inolvidável Apóstolo dos Gentios, não experimentássemos um “espinho” cravado na carne?!

A não ser motivado pela sinceridade de sua fé, com a cruz invisível do testemunho aos ombros, não busque o topo do monte, de onde os que o buscam com outro propósito se precipitam de modo espetacular.

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Estejamos, assim, conversados, e, embora lentamente, continuemos a grafar os nossos pensamentos, porque alguém que com eles, porventura, venha a se deparar haverá de aproveitá-los para que sinta inspirado a fazer mais e melhor.

A reta intenção é a salvaguarda da paz do espírito que, evidentemente, não estando isento de erro, sempre age com o intuito de acertar.

Sobretudo, considera a relatividade da opinião alheia e continuemos com a relatividade da opinião que nos pertence, porém, sempre em busca da Verdade que não se rende aos escusos interesses humanos.

No mais, o que por ora, além destas palavras amigas posso lhe oferecer, é uma vassoura nova para que você continue a exercitar os seus músculos espirituais, varrendo para fora de si os resquícios da poeira da vaidade e do personalismo, que, infelizmente, aqui e acolá, quase a sepultá-los vivos, se amontoa no espírito de muita gente.

Sigamos, porque ainda há muito a ser feito para o Senhor e com o Senhor, hoje e sempre.

 

INÁCIO FERREIRA

 

Uberaba – MG, 28 de Fevereiro de 2021.

 

 

 

 

 

domingo, 21 de fevereiro de 2021

 

Escolhas

 

Sem a intenção de pessimismo em nossa palavra, as escolhas que a Humanidade vem fazendo em relação ao seu futuro, infelizmente, não são nada otimistas.

Salvo exceções, e elas não são poucas, os espíritos atualmente encarnados no orbe terrestre vêm revelando grande desinteresse pelas coisas que lhes dizem respeito à essência do ser – do ser imortal, com a tarefa de cuidar do próprio destino, arcando com as consequências de seus atos.

Há, sim, um grande descaso em relação aos temas dos quais as religiões, ao longo do tempo, têm se apropriado, mas que transcendem o seu domínio – as religiões, como um todo, quando não ficaram ultrapassadas em seus postulados, desvirtuaram-se dos Princípios nos quais se alicerçaram.

O mundo, na atualidade, não sente falta de religiões, que contam-se às centenas, para todos os gostos e interesses, mas se ressente, profundamente, da ausência de religiosidade, ou, em outras palavras, de espiritualidade.

Emmanuel, o prefácio do livro “Nosso Lar”, de André Luiz, grafou em 3 de Outubro de 1943, portanto há quase 80 anos atrás: “...precisamos, em verdade, do ESPIRITISMO e do ESPIRITUALISMO, mas muito mais de ESPIRITUALIDADE.”

O que temos assistido, pois, em matéria de escolhas que os homens, em geral, estão efetuando, não nos autoriza a prognósticos que não nos induzam a receios de que as provas coletivas, doravante, venham a se multiplicar e a se diversificarem.

O homem, no que tange ao respeito e à ética, está chegando ao limite do “tolerável”, e não falta muito para que, de livre escolha, faça transbordar o fel da taça.

Infelizmente, imensas legiões de espíritos, em todo o mundo, que estão despertando para as realidades mais altas da Vida, não terão como serem poupadas das tempestades que hão de se abater sobre a Humanidade, e muitos haverão de sofrer as consequências do naufrágio em alto mar, sendo, porém, pela Lei Divina, recompensados pelos seus testemunhos de fé.

Quando o próprio Senhor não se eximiu, em favor das criaturas humanas, do martírio na cruz, não há um só espírito, por mais justo, que possa se considerar em situação de privilégio.

A Espiritualidade Maior, desde muito tempo, tem envidado esforços no sentido de que o homem, pelo menos, faça jus à sua condição humana, mas o lamentável espetáculo que assistimos nos leva a duvidar de que já tenhamos nos distanciado o suficiente de nossa condição primitiva.

Portanto, continuemos a orar e a vigiar, procurando, os que assim o desejarem, a perseverar nos caminhos do Bem, não contemporizando com o mal, nem que, para tanto, venhamos a conhecer o menosprezo da maioria.

Nada parece conseguir deter a marcha dos acontecimentos infelizes que estão se desencadeando, a curto e a médio espaço de tempo, que farão com que muitas lágrimas sejam vertidas, sob a insensibilidade daqueles que se julgam inatingíveis pelas provações que irão bater às portas de seus bunkers e de suas fortalezas palacianas, nivelando-os ao mais comum dos mortais que sempre abjuraram em sua condição social.

Que o Cristo nos auxilie a não tergiversar na hora do testemunho pessoal e, resignados, aceitemos a parte que nos compete, qual, outrora, os cristãos, de todas as idades, aceitavam o sacrifício nos circos de martírio, faceando, a cantar, a morte com que se deparavam nas fogueiras, nas câmaras de tortura e na boca das feras famintas que as devoravam vivas.

 

INÁCIO FERREIRA

 

Uberaba – MG, 21 de Fevereiro de 2021.

 

 

 

 

 

 

 

domingo, 14 de fevereiro de 2021

 

Médiuns Familiares

 

“Mulheres receberam, pela ressurreição, os seus mortos.” – Hebreus, cap. 11 – v. 35

 

Em sua Epístola aos Hebreus, Paulo escrevendo a respeito de quanto tantos, desde os tempos mais antigos, sofreram no testemunho da fé, refere-se às mulheres que se fizeram médiuns de “seus mortos”, ou seja, daqueles que, tendo demandado o Mundo Espiritual, comunicaram-se por intermédio de intérpretes existentes no próprio grupo familiar.

Interessante destacarmos na reflexão que estamos efetuando, três situações no versículo, no texto constituído de apenas sete palavras:

1-    “Mulheres”.

2-    “Ressurreição”.

3-    “Seus mortos”.

Analisemos, com síntese.

As “mulheres”, no exercício da mediunidade, de fato, têm se revelado portadoras de psiquismo mais sensível que os homens... Não olvidemos que, na Obra Ciclópica da Codificação, foram as mulheres que mais valeram o Codificador, não pretendendo, com isto, dizer que os espíritos encarnados como médiuns no sexo masculino, igualmente, não logram se desincumbir de seus deveres de ordem mediúnica.

Quanto ao termo “ressurreição” claro está que o Apóstolo referiu-se à sobrevivência do espírito, após a morte física, conservando a identidade que lhes diz respeito, com a possibilidade assim de entrarem em contato com os que deixaram nas retaguardas da luta humana na Terra. Inclusive, no mesmo versículo citado acima, Paulo complementa grafando “Alguns foram torturados, não aceitando seu resgate, para obterem superior ressurreição”, significando, com clareza, que tais se negaram a renunciarem à sua fé com o propósito de escaparem ao martírio, e que assim procederam para que a sua “ressurreição”, ou seja, o seu regresso ao Mundo Espiritual não os cobrisse de vergonha e não lhes viesse a ser um peso na consciência.

Com referência aos “seus mortos”, que, em essência, é o objetivo de nossos estudos no Blog desta semana, concluímos, sem dificuldade, que as comunicações mediúnicas podem se fazer mais autênticas quando acontecem através de médiuns familiares dos desencarnados.

Médiuns, de certa maneira, “estranhos” aos espíritos que os procuram para contato com os que ficaram na Terra, ou que, na grande parte das vezes, são procurados pelos encarnados para contatarem os seus entes amados que partiram, são instrumentos mais difíceis de serem utilizados, com o êxito que se deseja, na obtenção das notícias almejadas.

No futuro, pois, não muito distante, quando a mediunidade se mostrar mais generalizada entre as criaturas encarnados, os médiuns familiares serão em maior número e, assim, eles mesmos haverão de se encarregar do contato com os precederam na Grande Mudança.

No livro “Nosso Lar”, no capítulo 48 – “Culto Familiar” –, André Luiz descreve a manifestação de Ricardo, que já se encontrava encarnado, portanto, em um contato mediúnico “às avessas”, valendo-se das condições que, principalmente, lhe eram oferecidas pelos integrantes de sua família...

Meditemos no conteúdo do versículo da Carta de Paulo aos Hebreus, e procuremos ampliar as nossas concepções em torno do intercâmbio mediúnico.

 

INÁCIO FERREIRA

 

Uberaba – MG, 14 de Fevereiro de 2021.